Quando a Benedita Pestana me propôs participar em O Armário e dada a sua especificidade de pensar numa intervenção artística onde o armário é o espaço expositivo, ocorreu-me utilizá-lo como um expositor de um museu imaginário da Mulher, de artefactos, numa associação entre o Manuscrito de Voynich e as deusas da fertilidade pré-históricas, das Sheelas na Gig medievais que mostram a vulva poderosa e orgástica capaz de afastar o mal e seres escondi-dos em buracos-tubos, mas a emergir.

O título da exposição remete para o codex ilustrado e escrito num complexo código ainda por decifrar, e por isso, um caso famoso e misterioso na história da criptografia. Datado através de radiocarbono no início do séc. XV (1400-1439) e escrito provavelmente na Europa Central. O seu nome não se deve às suas características misteriosas, nem às sua autoras ou autores mas ao bibliógrafo e antiquário polaco que o comprou em 1912 e o tornou conhecido. Atual-mente o manuscrito está guardado na biblioteca de livros raros da Universidade de Yale. Indecifráveis as palavras restam-nos as ilustrações para efabular: mulher, corpo, água, tuba-gens, plantas e estrelas. Indicadores de temas como a saúde e a botânica ligados à mulher, o que hoje se designa comummente de Saúde da Mulher, mas em código, ilegível, incompreen-sível e talvez uma estratégia para evitarem de serem queimadas vivas, de serem considera-das bruxas ou bruxos como Zenão, o cientista filósofo e alquimista, do livro A Obra ao Negro de Marguerite Yourcenar.

Bruxa, nesta folha de sala, é sinónimo de mulher cientista, artista, botânica, médica e in-vestigadora. Mulheres que emergem e que finalmente saíram do armário.

Para a realização das peças de cerâmica em barro preto tive o apoio e a ajuda inestimável da professora e artista Virgínia Fróis que generosamente se dispôs a ajudar-me a concretizar este projeto utilizando o processo de cozedura das peças de cerâmica para a obtenção do barro enegrecido, o tradicional barro preto da nossa cerâmica vernacular, característico do concelho de Vila Real (Bisalhães) e de Viseu (Molelos).

16 de Março de 2019
Alice Geirinhas